Desempregados lutam por chance num Brasil de poucas oportunidades

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Com mais de 12 milhões de brasileiros sem ocupação, as dificuldades para recolocação profissional variam conforme a faixa etária e a escolaridade.
Por: Roger Dias – Estado de Minas
Jackson Gonçalves, de 31 anos, da faixa etária em que é maior o percentual de desempregados, segundo o IBGE
 

“Mandei uns currículos, mas o mercado ficou muito seletivo. Tem muita gente procurando emprego, e isso impede que todos tenham oportunidades”, Jackson Gonçalves, de 31 anos(foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press)

O caminho árduo e o olhar distante pelas ruas de Belo Horizonte demonstram misto de tristeza e preocupação para Jackson Gonçalves, de 31 anos, um morador entre tantos outros do Bairro Serra que lutam para encontrar  trabalho fixo. São praticamente cinco anos sem carteira assinada, o que levou Jackson abrir mão de desejos e conquistas para sua família. O drama se repete em lares dos cerca de 12 milhões de brasileiros que vivem à procura de emprego, segundo dados mais recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Jackson pertence à faixa etária que mais sofre com a desocupação desde 2020. Entre os trabalhadores de 25 a 39 anos, o percentual de desempregados atingiu a marca de 35,2%. Já os jovens de 18 a 24 anos sem ocupação correspondem a 30,8% do total, como aponta a pesquisa Pnad Contínua do IBGE, referente ao quarto trimestre do ano passado. 

A dificuldade se agrava já que, quanto mais tempo o trabalhador passa desempregado, mais complexa será a reinserção no mercado de trabalho. No último emprego fixo, Jackson foi  auxiliar de limpeza, em 2016, numa empresa de informática. A demissão dele ocorreu devido a cortes de despesas. Desde então, contou com a ajuda da mulher, Gislene, que trabalha como diarista, para garantir a alimentação do casal e dos dois filhos pequenos. Para aumentar a renda da família, ele faz serviços como auxiliar de pedreiro, carrega móveis e faz pequenos favores em troca de gorjetas. No fim do mês, recebe, no máximo, R$ 800.

 

“Às vezes, você tem uma oportunidade e espera ficar um bom tempo trabalhando, mas a vaga só dura dois meses. Foi assim comigo. Mandei uns currículos, mas o mercado ficou muito seletivo. Tem muita gente procurando emprego, e isso impede que todos tenham oportunidades”, afirma Jackson, que atribui a dificuldade de inserção ao mercado à falta de estudo. Ele cursou somente até a sétima série do ensino fundamental.

Em outra face da mesma dificuldade, a estudante Giovana Lima, de 15, também encontrou barreiras ao procurar uma vaga de menor aprendiz na área administrativa. Há seis meses ela vem tentando vaga, mas só encontra negativas. Nesse período, fez cursos de informática para se qualificar melhor. “A idade é um fator importante, porque quase nunca dão chance para quem nunca trabalhou. A pandemia também complica, pois muitas empresas deixaram de contratar menores. A economia está devastada. Deveriam abrir mais vagas, o que incentiva as pessoas a comprarem e consumirem mais. Logo, tudo se recuperaria”, avalia.

 

Segundo o analista do IBGE Alexandre de Lima Veloso, o que pesa contra os trabalhadores mais jovens é justamente a falta de experiência: “A inserção no mercado de trabalho da força mais jovem historicamente sempre foi mais difícil. Com a pandemia, tivemos a redução dos empregos formais. Quem já estava inserido e conseguiu trabalhar de casa foi menos afetado do que quem estava buscando nova oportunidade, como é o caso de trabalhadores nessa faixa. Essas pessoas trabalhavam há menos tempo, com menos qualificação e experiência, o que ajuda a explicar o cenário negativo”.

Para quem tem mais idade, muda o motivo, mas o problema da falta de trabalho se repete. Paulo Roberto de Souza, de 57, tenta novo emprego na construção civil. Com apenas a quinta série, ele está há três anos desempregado. Separado da mulher desde o ano passado, passou a morar sozinho nas ruas da capital, vivendo de lavar e cuidar de carros na área central. Para ele, o fato de não ter conquistado nova oportunidade se deve à idade. “Procuro emprego todos os dias, mas, como passei dos 50, isso me impede de conseguir algo mais concreto. Não tenho tanto pique como antigamente para pegar um serviço pesado. Não tenho tanta escolaridade e isso dificulta. E também não tenho quem me indique uma oportunidade”, enumera.

INFORMALIDADE


A taxa de desemprego média no Brasil no ano passado foi 13,2%, inferior aos 13,8% de 2020. Apesar disso, é o segundo maior índice já apurado pelo IBGE na série histórica de dados da Pnad Contínua, iniciada em 2012. Segundo a consultoria Trading Economics, que leva em consideração 24 países de vários continentes, das nações desenvolvidas às emergentes, a taxa brasileira é a quarta mais alta, superada apenas por África do Sul, Espanha e Turquia.

 

Para Rodolpho Tobler, economista da Fundação Getulio Vargas (FGV), a pandemia da COVID-19 só ajudou a ampliar os problemas vividos anos anteriores no Brasil: “É preciso lembrar que antes da pandemia a taxa de desemprego já estava muito elevada. Tivemos uma grande crise entre 2014 e 2016, e o mercado de trabalho se recuperou muito lentamente, com informalidade, salários e produtividade mais baixos. O resultado que vemos agora é o desfecho de um longo período em que enfrentamos esses problemas, acentuado pela COVID-19. Estamos recuperando boa parte disso, mas ainda com salários baixos e empregos de menor qualidade.”

 

Até mesmo para quem está empregado a situação já é difícil. De acordo com o IBGE, o rendimento médio dos trabalhadores no Brasil foi estimado em R$ 2.447 de outubro a dezembro de 2021, tendo apresentado redução de 3,6% frente ao 3º trimestre de 2021 (R$ 2.538) e de 10,7% frente ao quarto trimestre de 2020 (R$ 2.742). Ou seja, diante da alta inflação no país, os brasileiros estão cada vez recebendo menos.

Tobler diz que o desafio para o país é justamente ter um crescimento econômico amplo, com melhora nos números do Produto Interno Bruno (PIB) e surgimento de novas empresas, para uma mudança de cenário. Nesse sentido, a informalidade é mais uma etapa a ser vencida: “A informalidade seria uma saída para as pessoas que não conseguiram nenhum tipo de trabalho, pois não precisam de processos seletivos e de burocracia para obter ocupação. Essa informalidade tem ocorrido por necessidade. As pessoas têm buscado porque não têm opção. Isso gera perda de poder de compra, o que afeta o crescimento econômico”.

 

O índice de desemprego em Minas foi inferior à média nacional (11,7%), mas ainda é a terceira maior taxa da série. O total de pessoas desocupadas no estado passa de 1 milhão. Em relação ao país, Minas tem historicamente taxas um pouco abaixo da média nacional. Os estados do Norte e Nordeste contam com taxas bem acima da média. “o desafio em 2022 é passar pela turbulência política e que a economia deixe para trás os efeitos da pandemia e seja capaz de gerar maior quantidade de empregos e com mais qualidade, com carteira assinada e benefícios previdenciários, mais segurança e remuneração”, ressalta Alexandre de Lima Veloso.

Ofertas localizadas frente à crise geral

 

Ainda que o Brasil enfrente situação de penúria no surgimento de vagas, alguns setores apresentaram destaque na reinserção no mercado de trabalho. No fim do ano passado, a alimentação e o alojamento, com 23,9% de postos a mais que em 2020, e a construção civil, com 17,4%, foram aqueles que mais apresentaram ofertas de trabalho, mesmo que com remunerações mais baixas.

 

Contudo, o professor de economia Mário Rodarte, da UFMG, ressalta que essas áreas não são capazes de melhorar a situação do trabalhador brasileiro: “Vemos uma retomada de alguns empregos que antes estavam pressionados pelo isolamento da COVID-19, com remuneração mais baixa. O trabalhador continua com a mesma renda nominal e não teve aumento.  As expansões ocorrem em setores mais requintados, mas a maioria dos trabalhadores está numa situação mais precária”.

 

Segundo ele, a crise econômica impediu que as classes trabalhadoras também lutarem por melhores condições de vida e remunerações mais qualificadas: “Várias categorias mal conseguem o reajuste para recompor as perdas do período. O mercado, muitas vezes, não está aquecido, e isso acaba enfraquecendo o processo de negociação feito pelos trabalhadores”.

Empreendedores por necessidade 

A pandemia de COVID-19 também pode ter ampliado o empreendedorismo por necessidade em Minas Gerais. Entre os microempreendedores individuais (MEIs) que começaram um negócio após o início da pandemia, 40% empreenderam por falta de alternativa de trabalho e renda, contra 36% dos que haviam iniciado o negócio antes desse período pelo mesmo motivo. Os dados são da Pesquisa Perfil e Comportamento do Microempreendedor Individual de Minas Gerais, feita pelo Sebrae Minas.

 

Segundo o estudo, o surgimento de microempresas ocorre com mais frequência entre pessoas acima de 45 anos, que cursaram o ensino médio ou o técnico incompleto. A pesquisa mostra também que nove a cada 10 microempreendedores no estado contribuem com o orçamento doméstico, sendo 40% os únicos responsáveis pela manutenção da casa. Outros 18% são os principais mantenedores do domicílio e 35% complementam a renda.

 

“A crise econômica desencadeada pela pandemia teve vários reflexos sociais, entre os quais o desemprego. Esse cenário só agravou a dificuldade que as pessoas com mais de 45 anos e com menor escolaridade têm de conseguir um emprego com rendimento satisfatório. No caso dos que têm menor escolaridade, a baixa qualificação é um dificultador; quanto aos de mais idade, um motivo pode ser o preconceito enfrentado ao procurar emprego”, avalia Paola La Guardia, analista da Unidade de Inteligência Empresarial do Sebrae Minas. 

 

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