Sabesp privatizada: Faltará água e a conta continuará a crescer

  • Por Wanderley Parizotto – economista

Na contramão do mundo, a privatização da Sabesp foi um erro e quem pagará por isso será a população

Enquanto grandes cidades e países ao redor do mundo recuam de experiências mal sucedidas  de privatização dos serviços de água e esgoto, São Paulo decidiu seguir o caminho oposto. A privatização da Sabesp, empresa responsável pelo saneamento básico de milhões de paulistas, representou não apenas uma decisão controversa, mas um erro estratégico com impactos sociais, econômicos e ambientais de longo prazo.

A água é um bem essencial à vida, reconhecido pela Organização das Nações Unidas como um direito humano fundamental. Tratar esse recurso como mercadoria, subordinando sua gestão à lógica do lucro, tem se mostrado problemático em diversos países. Paris, Berlim, Buenos Aires e dezenas de outras cidades reestatizaram seus serviços de água após constatarem aumento de tarifas, queda na qualidade do serviço e redução da transparência administrativa sob gestão privada. O movimento global de “reestatização” do saneamento é hoje uma realidade documentada e crescente.

No caso da Sabesp, a privatização ocorreu apesar de a empresa apresentar histórico de capacidade técnica, know-how acumulado ao longo de décadas e resultados financeiros positivos. Em vez de corrigir falhas pontuais de gestão e ampliar investimentos públicos, optou-se por transferir o controle a grupos privados, cuja prioridade natural é a maximização de retornos aos acionistas. O risco é evidente: investimentos tendem a se concentrar onde há maior rentabilidade, enquanto regiões periféricas e menos lucrativas podem ser deixadas em segundo plano.

Outro ponto sensível é a perda de controle público sobre um serviço estratégico. O saneamento básico está diretamente ligado à saúde pública, à preservação ambiental e ao desenvolvimento econômico. Ao abrir mão do comando da Sabesp, o Estado reduziu sua capacidade de planejamento de longo prazo e de resposta a crises hídricas, como a que atualmente afeta São Paulo.

Não é por acaso  que a  campanha para redução de consumo de água no estado, só começou agora, mesmo o Governo sabendo há tempos que a crise hídrica aconteceria. A lógica é simples: Primeiro o lucro, e para ter lucro precisa vender. No caso a água. Depois vem o resto. 

 Em situações de escassez, decisões rápidas e orientadas pelo interesse coletivo são fundamentais — algo que pode entrar em conflito com contratos rígidos e interesses privados.

Além disso, a promessa de tarifas menores e maior eficiência, frequentemente utilizada como argumento a favor da privatização, raramente se confirma na prática. Experiências internacionais indicam que, após um período inicial, os custos para a população tendem a aumentar, seja por reajustes tarifários, seja pela redução de investimentos em manutenção e expansão da rede.

A privatização da Sabesp, portanto, não dialoga com as lições aprendidas no cenário internacional nem com as necessidades sociais do Brasil, país ainda marcado por profundas desigualdades no acesso ao saneamento. Em vez de fortalecer o caráter público de um serviço essencial, a decisão aprofunda a lógica de mercado sobre um direito básico.

Na contramão do mundo e do interesse coletivo, a venda da Sabesp pode se revelar um equívoco histórico. Seus efeitos, no entanto, não serão sentidos apenas nos balanços financeiros, mas principalmente no cotidiano de milhões de cidadãos que dependem da água como condição mínima de dignidade e cidadania.

Acontecerá com a água o que está acontecendo com a energia. A Sabesp é a nova Enel.

 

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Jornalista, autora de 5 livros, um deles semifinalista do Prêmio Oceanos 2020.

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