Wanderley Parizotto – economista
Segundo o IBGE, o número de brasileiros com idade acima de 60 anos era de 2,6 milhões em 1950 (4,9% do total), passou para 29,9 milhões em 2020 (14% do total) e deve alcançar 72,4 milhões em 2100 (40% do total populacional). Já o número de brasileiros com mais de 80 anos, era de 153 mil em 1950 (0,3% do total), passou para 4,2 milhões em 2020 (2% do total) e deve alcançar 28,2 milhões em 2100 (15,6% do total). E a partir de 2030, a população com mais de 60 anos será maior que a de jovens de 0 a 14.
Do ponto de vista demográfico, os números acima espelham, claramente, o que foi, o que é hoje e o que será o Brasil: um país no qual grande parte da população terá mais de 60 anos e uma parcela importante terá mais de 80. No mundo todo será assim. Haverá mais pessoas velhas do que jovens.
Este quadro pode ser considerado impeditivo ao crescimento econômico? Não vejo razão. Por que seria?
A questão não é a idade que se tem e, sim, como ‘nos encontramos’ na idade que temos em todos os aspectos: saúde física e mental, capacidade de trabalho e sociabilidade.
O avanço tecnológico na medicina proporciona cada vez mais longevidade física, com limites; evidente. Contudo, os limites de hoje são bem inferiores aos do futuro. Os números acima demonstram isso.
A saúde do cérebro, por exemplo, pode persistir mais quando os estímulos cognitivos contínuos feitos ao longo da vida por meio do trabalho, da leitura, das relações sociais saudáveis, da afetuosidade, sociabilidade (e etc.) são constantes.
Já a vitalidade física depende de como o corpo é cuidado. Quanto melhor for cuidado ao longo da vida, mais tempo haverá vitalidade. É óbvio.
Se há 100 anos ‘o mundo’ trabalhava, em média, até os 40 anos, era porque morria-se muito cedo.
Podemos viver no sentido amplo por mais tempo se cuidarmos dos aspectos mencionados.
Entretanto, para que grande parcela da população não seja, em um breve futuro, expurgada da economia, se tornando um problema econômico, a sociedade precisa olhar os mais velhos de outro jeito: como cidadãos como quaisquer outros de quaisquer idades.
No entanto, a capacitação profissional contínua, os cuidados com a vitalidade do corpo, a saúde do cérebro e a não exclusão social dependem, fundamentalmente, de políticas públicas.
Políticas Públicas para o envelhecimento populacional já!
A mudança de comportamento e visão em relação ao envelhecimento deve se iniciar na primeira infância. Nos primeiros anos da vida escolar, para que seja incorporada naturalmente na vida das pessoas, geração após geração. Isso é política pública.
Abrir e promover discussões sobre a questão do envelhecimento, de forma séria e inclusiva, nos mais diversos fóruns, entidades de classe, escolas, movimentos sociais organizados, associações e outros. Política pública.
Criar estruturas administrativas (secretaria, coordenadoria) do envelhecimento nos governos federal, estadual e municipal para entender a questão e promover a discussão, encaminhamento e execução de políticas. E não somente secretarias do idoso. Secretaria do idoso pensa no idoso. Secretaria do envelhecimento pensa no processo e no futuro.
É bem diferente.
Na década de 1970 o índice de mortalidade infantil no Brasil (crianças mortas antes de completar 1 ano de vida a cada mil nascidas) era de 120. Hoje é de 14. Dentre diversas medidas, foram feitas campanhas massivas para realização de pré-natal, aleitamento materno, higiene no pré e pós parto e etc. Política pública.
A poliomielite foi erradicada do país por meio de grandes campanhas de vacinação feitas pelo governo na mídia, nas escolas e etc. Política pública.
Estes dois fenômenos evidenciam, inequivocamente, que é possível vencer grandes adversidades, porém, para que isso ocorra, é fundamental ter crença naquilo que se propõe.
Não há discussão no governo nas três instâncias (Federal, Estadual e Municipal), a questão não é vista. Fala-se do idoso e não do processo do envelhecimento. E por que não há a discussão? Por preconceito.
Mais ou menos assim: “Vai ficar velho mesmo, final de vida, deixa para lá. Constrói um centro de convivência aqui, outro acolá. Faz uma olimpíada para terceira idade, um bailinho e está bom”.
A ignorância paira assustadoramente sobre questão.
O preconceito alimenta a ignorância e vice-versa.
Há movimentos sociais fortes de inclusão racial, de gênero, dos sem teto, sem terra, entidades empresariais e outros, que trazem os olhos da sociedade para as questões de cada segmento, a favor e contra. Há discussão, no mínimo.
Contudo, todos, independentemente da raça, gênero ou status social ficarão velhos.
E o conceito de velho na história do homem é mutante ao longo do tempo. Há 50 anos, ter 40 anos era ser velho. Hoje é ter 60. Em 2050 será ter 80 anos.
A exclusão da população (a maior parcela dela) com mais idade da economia, por falta de renda, incapacidade profissional e limitações físicas e mentais será, sem dúvida, um empecilho ao crescimento econômico.
É uma simples razão matemática. Não precisa ser gênio para entender isso. Mercado e consumo menores, arrecadação de impostos menor, gastos públicos com saúde e moradia para velhos maiores. Precisa explicar mais?
Como vemos, o problema não será causado pela idade, mas pela ignorância catapultada pelo preconceito.