Quando pergunto a Sharon Stone o que ela gostaria de dizer à sua versão mais jovem sobre resiliência, a reação dela surpreende a nós duas.
Chi Chi Izundu – BBC 100 Women
Conversamos sobre política, arte e Hollywood, mas, de repente, ela coloca a mão sobre os olhos, faz uma longa pausa e começa a chorar.
“Você vai conseguir”, responde a artista, de 66 anos. Esta é a mensagem que ela gostaria de passar. A atriz, ativista humanitária, escritora, produtora — e, mais recentemente, pintora — relembra o momento em que quase morreu por causa de uma hemorragia cerebral há 23 anos.
“Eu gostaria de ter sabido disso tantas vezes”, diz ela. “Quando estava no chão e não conseguia uma ambulância”, ela acrescenta.
“Quando fui para casa [do hospital] e li na revista People que não saberíamos por 30 dias se eu viveria ou morreria.”
Na ocasião, uma artéria havia se rompido, causando um Acidente Vascular Cerebral (AVC). Ela diz que teve 1% de chance de sobreviver, e precisou reaprender o básico, como andar e falar.
Ela continua listando os desafios que enfrentou desde então, incluindo problemas financeiros e uma batalha pela custódia do filho adotivo Roan com o ex-marido Phil Bronstein.
Até a minha pergunta, explica Stone, ela não havia reconhecido plenamente que havia passado por tudo aquilo. “Já faz tanto tempo, e está tudo bem… acabou… todo mundo conseguiu superar”, afirma.
Resiliência é o tema da edição deste ano do BBC 100 Mulheres, e ela sorri quando eu revelo que ela está na nossa lista de mulheres inspiradoras e influentes ao redor do mundo.
Stone foi alçada ao estrelato por sua atuação no thriller erótico Instinto Selvagem, de 1992. Ela foi rotulada como um símbolo sexual e, como resultado, acredita que acabou sendo estereotipada.
Mas ela usou sua fama para arrecadar grandes quantias de dinheiro para causas filantrópicas, inclusive para pesquisas sobre HIV e Aids.
“Estou muito orgulhosa de ter pegado essa ideia que foi inventada nesse filme — de que eu era muito sexy — e de tê-la usado para combater uma doença em que as pessoas estavam sendo punidas por sua sexualidade, porque eu estava sendo punida pela minha”, diz ela.
O trabalho de Stone no combate ao HIV/Aids rendeu a ela o Prêmio da Cúpula da Paz de 2013 — concedido pelos ganhadores do Nobel da Paz —, que reconhece personalidades do mundo da cultura e do entretenimento que contribuem para a paz e a justiça social.
No ano passado, ela foi homenageada como Cidadã Global do Ano pela Associação de Correspondentes das Nações Unidas.
Depois de Instinto Selvagem, Stone ganhou um Globo de Ouro e foi indicada ao Oscar de melhor atriz por sua atuação no filme Cassino, de Martin Scorsese, em 1995.
Nossa entrevista foi realizada em Turim, na Itália, depois que o museu de cinema da cidade a homenageou com o prêmio Stella della Mole por sua trajetória cinematográfica
Além do seu trabalho beneficente, Stone também tem falado abertamente sobre política, inclusive fazendo oposição ao presidente eleito dos EUA, Donald Trump. No dia da eleição, ela postou uma foto de si mesma com uma camiseta escrito “Mrs President” em apoio à então candidata Kamala Harris.
“Vejo o mundo de uma forma um pouco diferente de grande parte do meu país. Isso não significa que eu não seja patriota”, afirma.
Mas ela diz que vai “respeitar o cargo de presidente… porque é isso que uma democracia faz”.
Agora, no entanto, ela começou um novo capítulo como pintora de sucesso, expondo e vendendo sua arte ao redor do mundo.
Seu novo foco na pintura começou durante a pandemia de covid-19. Ela trabalha em um estúdio ao lado da sua casa em Los Angeles.
Suas obras de arte são ousadas e impressionistas e, em suas próprias palavras, “muito grandes”. Ela explica que isso se deve, em parte, ao fato de ter sido inspirada por uma tia que pintava murais nas paredes de casa — e também porque ela não consegue enxergar bem o suficiente para pintar obras pequenas.
Ela conta que não imagina como vai ser a criação final enquanto pinta. “Estou muito profundamente envolvida”, diz ela.
“É tão imersivo. É simplesmente maravilhoso.”
Também conversamos sobre namoro online — porque, sim, a superestrela de Hollywood Sharon Stone tem usado aplicativos de relacionamento, assim como muitas outras pessoas que tentam encontrar o amor. Ela chegou a ser até temporariamente bloqueada no Bumble depois que outros usuários acharam que seu perfil era falso.
Mas as plataformas digitais “não revelam a essência do relacionamento, que é a química”, observa. “Você tem que farejar isso por si mesmo como um porco que caça trufas”, ela acrescenta, rindo porque “não dá para sentir o cheiro pela tela”.
Stone afirma que o AVC a deixou “uma pessoa muito diferente”, mudando até mesmo os alimentos que ela gostava e aos quais era alérgica.
A indústria cinematográfica também mudou. No passado, diz Stone, “as mulheres estavam interpretando a fantasia dos homens” — que, segundo ela, escreviam, dirigiam, produziam, editavam e distribuíam os filmes.
Ela conta que não ficou convencida com as atitudes de algumas das personagens que interpretou. Mas agora, ela afirma: “Acho que estamos chegando a um ponto em que as mulheres estão apenas interpretando como uma mulher realmente se comportaria em determinada circunstância”.
Pergunto a Stone o que resiliência significa para ela.
“Podemos escolher entre reclamar e lamentar ou escolher a alegria — acho que você simplesmente deve continuar escolhendo a alegria”, diz ela.
“Esteja presente. Você caiu. Levante-se. Alguém te derrubou. Agora querem ajudar você a se levantar. Permita.”
Quando a entrevista chega ao fim, a equipe retoca a maquiagem dela. Ela bebe um pouco de água. Então, se levanta, me abraça e agradece pela minha pergunta sobre sua versão mais jovem, que ela diz ter sido “muito pungente”. Em seguida, ela me abraça novamente e sai.