Wanderley Parizotto**
Em meio a pandemia, a inevitável recessão econômica deu sinais em todo o mundo. Com ela o desemprego e desalento. O grande desafio que se coloca é evitar que a recessão se transforme em
depressão econômica…
… que se caracteriza por um estado agravado pela recessão, ou seja, um longo período de desemprego em massa, falência de empresas, baixos níveis de produção e investimentos etc.
Em nenhum momento da história, países saíram de graves recessões ou depressão sem volumosos investimentos públicos.
Vários países, depois de realizados fortes investimentos públicos começam a dar sinais incontestáveis de recuperação econômica e do emprego. EUA, por exemplo.
Diversos economistas, inclusive o ministro da Economia, acreditam que a iniciativa privada é capaz de resolver todos os problemas econômicos. Não é verdade. Nunca foi e nunca será.
A iniciativa privada visa o lucro. É justo. E só investe em ambientes econômicos confiáveis e promissores. Não há no mundo, em toda história, que tal lógica tenha sido diferente.
É simples, você colocaria seu dinheiro em algo incerto, confuso, sem claras perspectivas? Só se for maluco. Não há outra receita. O governo terá que investir e criar um ambiente favorável para puxar a iniciativa privada. O governo brasileiro terá que investir em obras de infraestrutura, hospitais, saneamento básico e outros para tirar o país do atoleiro, gerar emprego e renda. Terá que intervir no mercado financeiro usando os bancos públicos para baixar as taxas de juros na ponta para financiamento de empresários e pessoas físicas.
“O Procon realizou levantamento recente, envolvendo os seguintes bancos: Banco do Brasil, Bradesco, Caixa Econômica Federal, Itaú, Safra e Santander. No Empréstimo Pessoal a taxa média dos bancos pesquisados foi de 6,11% a.m. e no Cheque Especial, 7,56% a.m., Em ambas as modalidades de crédito não houve alteração das taxas praticadas pelas instituições, permanecendo iguais às praticadas antes da pandemia.” (Procon – Assessoria de imprensa)
O Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal deverão baixar drasticamente suas taxas de juros para que os Bancos privados baixem as suas. O BNDES ( Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) deverá financiar em longo prazo projetos de investimentos de forma muito agressiva, respeitando critérios técnicos. Ouvimos todo santo dia do Ministro da Economia que o país não tem dinheiro.
Primeiro é uma inverdade. O Tesouro tem R$ 1,3 trilhão em caixa. Mais, tem quase 400 bilhões de dólares em reservas cambias. E pode se endividar, por que não? O Governo não segue a lógica de endividamento de famílias e empresas que têm um limite claramente determinado pela capacidade ou do salário/renda ou pelo possível faturamento/lucro, falando de forma simplificada. Pode sim, se endividar para executar projetos de grande alcance social e econômico que gerem emprego, renda, bem estar social e desenvolvimento tecnológico.
O Brasil tem ainda uma enorme capacidade de endividamento. Comparada ao PIB (conjunto de riquezas geradas por um país) nossa dívida pública (85% do PIB) é muito menor que a dos EUA, Japão, zona do euro, Reino Unido e etc. Aliás, a dívida pública mundial é de 253 trilhões de dólares contra um PIB de 85 trilhões de dólares. O Brasil pode e deve se endividar mais, para executar bons projetos, de grande abrangência econômica, social e tecnológica, insisto. Projetos voltados à maioria da população e que contribuam para a distribuição de renda.
Quem deve pagar a conta?
O Brasil precisa urgentemente cobrar mais impostos dos mais ricos. Duzentas famílias brasileiras têm mais de um trilhão de reais e pagam, percentualmente, menos impostos que o resto da população. Por que não taxá-los e gerar capacidade para investir? Sempre alguém vai dizer: se taxar, eles levam embora.
Bobagem pura. Vão para onde e como? Em qualquer outro país os impostos pagos pelos mais ricos são muito mais altos do aqui.. 1% da população brasileira concentra 28,3% da renda total do país. Os mais ricos devem pagar esta conta.
O Brasil precisa de bons e sérios projetos
A cada R$ investido em saneamento básico, economiza-se R$ 4 em saúde.
Vejam que baita retorno do capital investido. Precisamos investir em infraestrutura, educação, formação e reciclagem de professores, biomedicina, nanotecnologia e outros. O Brasil tem capacidade, cientistas e técnicos para isso.
Sem educação nunca teremos crescimento sustentável.
Temos exemplos que tudo isso é possível. Hoje somos o segundo maior produtor e exportador de soja do mundo, ficando atrás apenas dos EUA. Sem a EMBRAPA, ligada ao Ministério da Agricultura, isso não seria possível. Através do seu trabalho e pesquisa, as sementes foram melhoradas, a produtividade por hectare subiu consideravelmente e sua cultura foi estendida à terras onde ninguém imaginava ser possível plantar soja. Há diversos exemplos: siderurgia e petróleo durante os governos de Getúlio Vargas. Em 1929, com a grande depressão mundial, nosso café, responsável por quase toda economia nacional, sucumbiu. O Brasil não produzia quase nada, basicamente, plantava e exportava café. Para enfrentar a crise, o governo investiu e muito.
O país passou a substituir bens importados por produtos que começaram a ser fabricados aqui.
O parque siderúrgico do Brasil e a exploração de petróleo nasceram das crises originadas em 1929 e pela segunda guerra mundial, com as criações da Companhia Siderúrgica Nacional, em 1941, e da Petrobrás, em 1953. Estas empresas, com certeza, não seriam criadas pela iniciativa privada dadas as incertezas e turbulências da época aliadas ao alto volume de investimentos exigidos.
Não há saída. A iniciativa privada só investirá se governo investir antes e criar ambiente econômico favorável. Assim foi, é e será no mundo inteiro.
Para salvar a economia da crise iniciada em 2008, o governo dos EUA gastou e investiu cerca de 10 trilhões de dólares para não deixar o sistema financeiro, montadoras e outras empresas falirem, bem como proteger empregos. Vale lembrar que o PIB de então era de 14,71 trilhões de dólares. Como o fez?
Aumentando sua dívida pública e emitindo moeda. O país quebrou? Não.
Para que ninguém ache que isso é coisa de comunista, abaixo um breve recorte na história dos EUA:
Como os EUA saíram da depressão iniciada em 1929?
Cenário à época:
A bolsa de valores quebrou;
Empresas faliram;
1 em cada 4 americanos estava sem emprego. Em um único mês, 20,4 milhões de americanos ficaram sem trabalho.
Franklin Delano Roosevelt ( presidente americano de 1933 a 1945) e sua equipe, elaboraram e executaram um plano chamado NEW DEAL, abaixo resumido:
O que foi – definição histórica
O New Deal (“Novo Acordo” em português) foi um conjunto de medidas econômicas e sociais tomadas pelo governo Roosevelt, entre os anos de 1933 e 1937, com o objetivo de recuperar a economia dos Estados Unidos da crise de 1929. Teve como princípio básico a forte intervenção do Estado na economia.
Principais características do New Deal (medidas e objetivos)
Fortes investimentos estatais em obras públicas
O governo dos EUA investiu, principalmente, na construção de obras de infraestrutura (pontes, rodovias, aeroportos, usinas, hidrelétricas, barragens, portos, entre outras). Os investimentos também foram para a construção de hospitais, escolas e outros equipamentos públicos. O principal objetivo destas medidas era a geração de empregos, pois os Estados Unidos sofriam muito com o desemprego elevado após a Grande
Depressão de 1929.
Reforma do sistema bancário e monetário
O governo dos EUA, através da modificação e criação de leis, passou a ter poderes de controle e fiscalização sobre o mercado financeiro. O objetivo era evitar fraudes financeiras, especulações e diminuir os riscos de operação dos bancos e demais agentes financeiros.
Controle de preços e produção das empresas
Como uma das causas da Crise de 1929 tinha sido o aumento dos estoques das empresas, o New Deal buscava resolver este problema através da fiscalização sobre os estoques das empresas, para que estes não aumentassem a ponto de gerar risco operacional para elas, levando-as à falência. Os preços das mercadorias também foram controlados pelo governo, a fim de evitar o aumento da inflação.
As medidas alcançaram êxito, revigorando novamente o capitalismo norte-americano, ao ponto de estudos afirmarem que dez anos após a implantação do New Deal, os EUA se aproximaram dos patamares econômicos em que se encontravam em 1929.
O remédio adotado pelos EUA a partir de 1933 não é o mesmo que o Brasil de hoje precisa na sua integralidade. Mas não é muito diferente em diversos aspectos.
O principal, sem o Governo a frente dos investimentos, a depressão virá.
** Economista e criador deste Portal.
Imagem de abertura: Moradores de Nova York durante a grande depressão – U.S National Archives/foter