Empresas que retêm trabalhador com mais de 50 anos visam consumidor e reconhecimento

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Pesquisa da USP analisou práticas de atração e retenção de profissionais mais velhos em organizações brasileiras; empresas inclusivas buscavam se comunicar com clientes da mesma faixa etária e reconhecimento enquanto marcas que respeitam a diversidade

  

Jornal da USP –  Camilly Rosaboni/arte Joyce Tenório

Práticas de inclusão que deem conta do envelhecimento populacional têm sido um tema recorrente da agenda pública, mas ainda enfrentam dificuldades relacionadas ao preconceito. O chamado ageísmo ou idadismo, ações de discriminação por causa da idade da pessoa, tem reflexos não apenas nas relações sociais, como no mercado de trabalho.

Entre 2020 e 2022, Aline Zanini Lima realizou a pesquisa de mestrado intitulada As empresas e o envelhecimento da força de trabalho: políticas e práticas para atração e retenção do trabalhador mais velho adotadas pelas organizações no Brasil, na Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Atuária (FEA) da USP. O objetivo da pesquisa foi identificar e analisar tanto as políticas e práticas formais adotadas para atração e retenção dos trabalhadores mais velhos, como os objetivos dessas organizações ao adotá-las. A dissertação teve a orientação do economista e professor Wilson Aparecido Costa de Amorim.

Aline Zanini Lima – Foto: Arquivo pessoal

A pesquisa partiu das observações pessoais da própria autora, Aline Zanini, ao fazer uma transição de carreira, aos 50 anos de idade. “Eu comecei a ter um contato com o mercado de trabalho novamente e percebi uma série de práticas de atração e retenção do trabalhador mais velho nas empresas”, conta ela. “Quando eu nasci, minha avó estava fazendo 50 anos. Eu, com a mesma idade, estou fazendo uma transição de carreira, para iniciar um novo ciclo profissional”, destaca.

O estudo identificou a questão da inserção do trabalhador mais velho como estratégia para melhorar a comunicação com clientes e consumidores com as mesmas idades. Além disso, reconheceu que essas práticas são pouco difundidas entre as empresas, reservando-se àquelas que zelam por reforçar sua imagem nas temáticas de diversidade e inclusão.

As empresas estudadas na pesquisa apresentaram níveis diferentes de tratamento a grupos minoritários. A princípio, há práticas mais bem estabelecidas para pessoas com deficiência, em seguida, mulheres, negros, LGBTQIA+ e, por fim, trabalhadores mais velhos. “É o pilar que está começando em termos de maturidade, a partir da experiência dos outros pilares”, pontua Aline.

A pesquisa

Aline utilizou dados do estudo FIA Employee Experience (FEEx), do Programa de Gestão de Pessoas (Progep) da Fundação Instituto de Administração (FIA). O levantamento destaca as empresas brasileiras com os mais altos níveis de satisfação entre os seus colaboradores e com as melhores práticas de gestão de pessoas. Na edição de 2020, analisada pela autora, 100 empresas foram reconhecidas como “lugares incríveis” para se trabalhar, por investirem em políticas e práticas de recursos humanos.

Além disso, Aline realizou um estudo de caso envolvendo quatro empresas, nacionais e internacionais, de médio a grande porte, e que já desenvolviam ações afirmativas de inclusão para ao menos quatro outros grupos minoritários.

A autora observou que há poucas empresas com políticas inclusivas bem estabelecidas, mas que existe o interesse para firmá-las em seu corpo de trabalho, seja por uma responsabilidade social, seja para melhorar a visibilidade de sua marca. “As empresas estão aprendendo a lidar com esse novo cenário de trabalho”, afirma.

Em um levantamento feito pelo Sistema Estadual de Análise de Dados (SEADE) em janeiro de 2023, com base em dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) Contínua do IBGE, pessoas com 60 anos ou mais já representam 26% da força de trabalho do Estado de São Paulo, um dos Estados com maior participação no PIB brasileiro.

De acordo com a Projeção de População, feita em 2018, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), até 2060, um quarto da população deverá ter mais de 65 anos. Com isso, práticas de reincorporação de trabalhadores mais velhos ainda estão em processo de desenvolvimento.

Vale destacar também a declaração feita pela Assembleia Geral das Nações Unidas da ONU sobre a Década do Envelhecimento Saudável (2021-2030), instituída em dezembro de 2020. A meta principal da iniciativa é construir estratégias para criar uma sociedade com melhores oportunidades para pessoas mais velhas.

Para André Silva, professor e pesquisador em gestão de pessoas na FEA, “fomentar práticas organizacionais mais inclusivas voltadas a profissionais maduros é uma forma de potencializar a sociedade que queremos ter: mais diversa, com equidade de oportunidades, inclusiva por princípio, e que se distancia de preconceitos, dentre os quais, os associados a idade”. Na faculdade, Silva integra a Comissão de Inclusão e Pertencimento (CIP) e leciona o curso de Gestão Inclusiva. O professor não participou da pesquisa.

Pessoas com 60 anos ou mais já representam 26% da força de trabalho do Estado de São Paulo – Foto: RODNAE Productions / Pexels

Seleção consciente

“O preconceito etário não é exatamente novidade no contexto das organizações e do trabalho formal. A idade continua sendo um desafio em processos seletivos, mas com o envelhecimento da população brasileira, a questão começa a ser olhada com mais cuidado, vertendo em práticas organizacionais”, lembra Silva.

As empresas analisadas pela pesquisa apresentaram projetos de atração e retenção do trabalhador mais velho. Isso ocorre desde o processo seletivo, com a seleção às cegas, para diminuir preconceitos étnicos, etários e de gênero.

Outra medida inclusiva é a busca efetiva de profissionais com 50 anos ou mais de idade, com vagas reservadas especialmente para o público. Algumas empresas fornecem, inclusive, consultorias a fim de preparar não só esses profissionais, como também o restante dos colaboradores para o novo cenário de trabalho. “Os programas de mentoria de carreira ajudam a diminuir estereótipos associados à idade”, observa Silva. “Sem essa preparação, o trabalhador mais velho pode não encontrar receptividade, não se sentir inserido, e sair da empresa depois de um ou dois meses”, exemplifica Aline.

Porém, uma vez que o trabalhador mais velho é inserido na empresa, não há práticas específicas para manter a sua mão de obra. “As práticas adotadas para reter os outros profissionais são as mesmas para o trabalhador mais velho”, afirma Aline, trazendo como exemplo aumentos salariais e promoções.

A pesquisadora explica que a área de gestão de pessoas já busca inserir jornadas de trabalho mais individualizadas. “Isso para todos os profissionais, para que eles possam criar suas jornadas voltadas às suas próprias necessidades”, observa Aline. “O olhar da organização precisa ser cada vez mais focado no indivíduo e não na massa”, complementa.

Preconceito etário

Apesar de não ser o foco da pesquisa, Aline notou a repetição de um problema nas entrevistas que realizou: o preconceito com a idade. “Era um tema que não deixava de aparecer, vindo de pessoas mais jovens com os mais velhos, ou mesmo o contrário”, observa a pesquisadora.

Aline identificou uma intolerância por parte dos jovens para com pessoas com 50 anos ou mais, pois entendem que elas são resistentes à tecnologia e a mudanças. Por outro lado, há uma rejeição dos mais velhos aos mais jovens pela ideia de que eles são impulsivos e imprudentes, além de demonstrarem um desapego maior em relação ao trabalho, mudando facilmente seu ciclo de carreira. 

Nesse sentido, o jovem tem um papel importante na construção de um ambiente de trabalho mais inclusivo. “É necessário haver muita conversa e aproximação, para tornar essa relação mais livre de preconceitos do que o outro faz ou é”, afirma a pesquisadora.

Um levantamento, feito pelo Vagas.com, Colettivo e Talento Sênior com 6.200 candidatos, em agosto de 2022, mostrou que 24% dos profissionais de 30 a 39 anos já sofreram algum tipo de discriminação no ambiente de trabalho por causa da idade. “Ao mesmo tempo que esses dados podem acentuar estereótipos, são dados que se somam ao reconhecimento da enorme relevância que a pauta do etarismo possui e deve ter”, destaca o professor Silva. (imagem https://www.freepik.com/author/yanalya)

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